20/02/16

Risotto de limão com navalhas

Quando eu era puto, costumava passar as férias de Verão em Setúbal e ir à praia num verdadeiro Paraíso que dava pelo nome de Tróia. A Atlântida afundou-se e a Tróia estragou-se.
Mas não se estragaram as memórias de uns mariscos fantásticos que dão pelo nome de navalhas, e que então se apanhavam com relativa facilidade em certas zonas daquele areal a perder de vista, tão longe da destruição que lhe foi infligida pela "indústria do turismo".
As ditas navalhas terminavam invariavelmente numa sertã regada com um fundo de azeite, uns dentes de alho e muitos coentros. Era de comer, recomer e molhar o pão na molhaca que sobrava.
Puro e duro, pois ninguém pensava em nouvelle cuisine nem em pratos grandes com uma ilha no meio só para encher o olho e deixar a barriga a dar horas.
Hoje atravessaram-se-me no caminho umas belíssimas navalhas: olhei para elas, com o meu jeito tímido costumeiro, as malandras piscaram-me o olho e saltaram feitas doidas para o cesto das compras.


Mais uma volta pelos corredores em busca de promoções, e não é que as navalhas se puseram a mandar piropos para uma garrafa de tinto com uma lontra no rótulo?!?!


O noivado ficou logo ali anunciado, faltava apenas tratar da boda, que se queria condigna, mas sem luxos nem modernices. Havia que preservar o gostinho das navalhas e tratá-las com o maior dos desvelos.
Como quem diz Guadiana, diz Algarve; e quem diz Algarve diz Cabanas; e quem pensa em Cabanas imagina-se logo sentado à mesa da Noélia, foi só puxar um pouco pela memória e recriar o famoso arroz de limão.
Saiu um risotto, feito segundo e seguindo os preceitos de outra receita já aqui botada. O carolino cedeu a vez de boa vontade ao risotto e o robalo não se espinhou por ser trocado pelas navalhas.
Terminou tudo num casamento perfeito.